sexta-feira, 7 de maio de 2010

Thalberg - Concerto para Piano e Fantasias sobre temas de Rossini


Razumovsky Symphony Orchestra
Regente Andrew Mogrelia
Piano : Francesco Nicolosi

     A rivalidade entre Liszt e Thalberg foi alimentada mais pelo folclore que por fatos reais. Num ambiente de fofocas e falsas intrigas, declarações atribuídas a ambos escandalizavam partidários ávidos por um confronto definitivo. Segundo rumores até mesmo Chopin teria desconfiado que Thalberg executava indicações de dinâmica com um dos pedais, em vez de usar os dedos. Após uma série de mal-entendidos divulgados calorosamente pela imprensa e um recital em conjunto, Liszt perguntou durante uma reunião social: "Porque fazer inimigos dois artistas apenas por um não enxergar no outro o valor que lhes dá o público? Não estamos reconciliados se nos estimamos mutuamente fora do âmbito musical?"
          Assim como Liszt, Thalberg encontrou no piano seu principal meio de expressão. Compôs pouco para orquestra, inspirou-se em peças consagradas e criou outras tantas de gêneros livres. Arrebatou platéias e viajou o mundo, passando inclusive pelo Brasil. Sua aposentadoria foi dedicada ao cultivo de vinhedos na Itália.
          O concerto para piano Op 5 não é, certamente, obra fundamental do repertório, apesar de esconder em seu Adagio surpresas maravilhosas. O primeiro movimento também possui passagens inspiradas do solista, mas o tratamento dado à instrumentação deixa a desejar. Após a exposição do tema principal, a orquestra atua apenas com suportes tímidos ao piano ou acordes pontuais em tutti. Mais desenvolvido, o rondó final faz jus ao gênero de concerto ao proporcionar espaço para a exposição orquestral.
          Baseada na sétima sinfonia de Beethoven, a Fantasia Op. 39 tem início com fragmentos sugestivos dos temas principais, que são expostos a seguir com leitura nova e acréscimo de material virtuosístico.
          O Noturno Op. 28 é uma peça cuja nobreza reside na sinceridade retórica de suas melodias. Nessa confissão sem palavras, o ouvinte torna-se íntimo do autor a ponto de responder-lhe a nota final, que não foi escrita. Trata-se de uma cumplicidade raramente alcançada pela linguagem da música.
          A interpretação de Nicolosi é impecável e a pequena diferença na qualidade do som do Concerto para as demais composições do cd está longe de representar qualquer avaliação negativa.

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     A liberdade de que desfrutavam os compositores do século XIX possibilitou o desenvolvimento de concepções como o Poema Sinfônico, a Paráfrase, Rapsódia e inúmeros outros gêneros que condensam a idéia que possuímos ainda hoje de inspiração artística. A leitura de um romance, uma sinfonia ou a contemplação de uma paisagem ofereciam a substância necessária à criação de novas obras musicais. Transcrições proliferavam facilmente, mas o uso livre e inventivo de peças do repertório consagrado prevalecia na escala de valores dos artistas e também do público.
          Essa prática não deve ser vista como desmerecedora da obra original nem fonte de peças de pouco valor, pois parte do princípio de que uma boa composição oferece material capaz de originar outras criações. Evitando associações melódicas indiscriminadas, compositores sérios escolhiam poucos temas de uma mesma peça e levavam adiante a tarefa criativa de conferir-lhes novos acompanhamentos, enfatizar seus aspectos dentro de uma nova coerência e explorar efeitos virtuosísticos. Precisavam, antes de tudo, demonstrar que a inventividade e a técnica de que dispunham não reduziam a obra utilizada a um mero pot-pourri. Uma reverência implícita paira, enfim, sobre todo o conteúdo dessas novas criações.
          As Fantasias desse Cd são o produto da liberdade no uso de temas Rossinianos. A interpretação respeita as características de 'canto ao piano' do compositor e Francesco Nicolosi evoca até as coloraturas vocais durante a execução das passagens tipicamente italianas. Gradação de intensidades, acrobacias Paganinianas e uma densidade harmônica que remete a Liszt estão presentes nessa seleção. Impossível não reconhecer a qualidade dessas obras.

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