sexta-feira, 7 de maio de 2010

Tesouros do Morro do Castelo


     Em Novembro de 1759 um decreto do Marquês de Pombal chegava às mãos do Conde de Bobadela, Governador do Rio de Janeiro: todo o patrimônio pertencente à Companhia de Jesus deveria ser confiscado e seus integrantes feitos prisioneiros. Colégio e Igreja situados no antigo Morro do Castelo foram imediatamente cercados. Encarcerados os 200 religiosos encontrados no local, deu-se início à busca por documentos, dinheiro e bens que, segundo acreditavam, eram mantidos escondidos nas dependências da igreja.
          Esse é o ponto de partida de um interessante capítulo da história carioca pesquisado pelo arquiteto e diplomata Carlos Kessel. Lançado recentemente pela Zahar Editora, o trabalho está embasado em fontes dos arquivos do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e em livros e revistas de época. Os desdobramentos dessa narrativa revelam aspectos surpreendentes dos acontecimentos que durante séculos ocuparam a imaginação dos habitantes da cidade.
          Sede administrativa dos negócios que se estendiam pelo interior e envolviam criação de gado, cultivo de cana e olarias, o conjunto de igreja e colégio da Companhia de Jesus exercia enorme influência na vida econômica e cultural brasileira do Séc. XVIII. Desde o saque de Duguay-Trouin em 1711 suspeitas sobre enormes riquezas decorrentes das variadas atividades pairavam sobre os religiosos. O próprio invasor francês estabeleceu-se no colégio na tentativa de apoderar-se da fortuna, mas após o pagamento exigido pelo resgate da cidade, partiu convencido de que uma embarcação havia sido vista em fuga com o suposto tesouro.
          Um inventário datado de 1758 e autenticidade nunca confirmada lista cifras espantosas para o patrimônio da Companhia. Nada menos que quarenta e uma toneladas de ouro em pó, vinte e três em moedas, diamantes e inúmeras peças cerimoniais teriam sido escondidas em galerias nos subterrâneos do morro do Castelo. Acompanhando o levantamento um mapa indica a localização de túneis e um enorme salão central. Um dos trajetos passaria sob a rua da Quitanda e outro sob a atual praça da Cinelândia.
          O cumprimento da ordem de prisão e confisco do patrimônio da Companhia em 1759 frustrou as expectativas de Pombal. Poucas peças de valor foram encontradas e, na esperança de obter informações sobre a fortuna, o rei decretaria a revogação de penas e doação de 1/3 dos bens a quem soubesse de seu paradeiro. Em vão. A convicção sobre a riqueza oculta firmou-se ainda mais no imaginário de governantes e do povo.
          Durante o séc. XIX vários projetos para a derrubada do morro e melhoria da ventilação urbana davam como certa a localização do tesouro, que seria então usado no custeio dos empreendimentos. Negociantes chegaram a formar uma associação, mas os trabalhos de longas escavações terminariam sem qualquer resultado, levando seus participantes à bancarrota.
          Em 1905, por ocasião das obras para a abertura da Avenida Central, uma notícia se espalhou pela cidade. O corte feito no morro na altura da atual Biblioteca Nacional havia revelado um túnel. O Ministro da Fazenda e Paulo de Frontin, responsáveis pela execução do projeto, foram chamados às pressas e até mesmo o presidente Rodrigues Alves desceu aos subterrâneos para averiguar a descoberta. A existência do sistema de galerias e do salão central registrados no antigo mapa estava confirmada oficialmente.
          A demolição do morro concluída na década de 1920 não pôs fim à questão. Até onde iriam as galerias que não foram descobertas pelas escavações de Paulo de Frontin? Estaria o tesouro dos Jesuítas nos subterrâneos da Avenida Rio Branco? Haveria algum outro conjunto de túneis sob a cidade? As pistas estão dadas.

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